28.10.10

O rastilho da pena (poema musicado)

Olá, amigos leitores.
Gostaria de encerrar o mês de Outubro, trazendo um poema do meu amigo e poeta José Silveira, que é também um leitor desse blog.
Tive a felicidade de musicá-lo e deixo aqui para a apreciação de vocês.
Agradeço pela presença.
Abraço a todos.




extraído do poema "Séricos I" de José Silveira
Música: Frederico Salvo
**************


Sempre ardo em febre
possuído por tantas palavras.
Nunca soube ao certo
o que escrevo

apenas assisto
o rastilho da pena

queimando o papel
gravando os versos
com riscos de fogo.

Mas ela veio
e me disse baixinho:
Não acredito que escrevas somente,

Acredito sim; “que pinta palavras
com cores quentes, as rimas febris
nesses versos ardentes...
palavra que cega-me,
mas fica.”


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26.10.10

Dorme e sonha


Dorme.
Não há mais o que fazer
Essa noite.
Dorme e sonha,
Pois fazê-lo acordado
É sempre mais perigoso.
Esquece o mundo e dorme
Porque a hora não é mais exata
E talvez nem tão necessária.
Dorme.
Não há vestígios lá fora
Da noite boa que virou dia,
Do riso farto que virou noite.
Dorme e sonha,
Pois de sonhos quase não te recordas
Nem uma imagem fugidia
Numa fugidia madrugada.


Frederico Salvo

23.10.10

Abismo


Se não fosse todo esse abismo entre as nossas margens,
Seria seu o meu todo.
Sua pele o lençol que emolduraria o meu sono.
Sua boca o meu cálice.
Haveria de ter a felicidade o mesmo sabor dos nossos momentos,
A mesma intensidade das nossas entregas.


Frederico Salvo

16.10.10

Sol do meio-dia


Melodia linda de alaúde.
Iandara* (sol do meio-dia).
Alimento bom que me sacia.
Flor do amor maior qu'eu não pude.

Rebuscada tela do artista.
Nascimento, vida, riso fácil.
Poesia rica, indelével.
Paisagem que me enche a vista.

Só por ti meu verso se afina.
Só no teu amor eu acho graça,
Pois em ti traduzo meu segredo.

Cama, água, beijo, seda fina,
Lua, brisa, sonho, bela raça,
Alma, vinho, chuva, alegreto.


Frederico Salvo.

*Em tupi-guarani: "Sol do meio-dia"

13.10.10

A flor


Você que passa e vê
Que há tanta graça em mim.
Sou uma flor e o meu olor
Dou pra lhe satisfazer.

Não peço nada em troca. Não!
Desabrochada ou em botão
Dou-me de graça
Só pra prover intenso prazer.

No seio da floresta
Em festa me embelezo
Quando mais ninguém me vê.

E me visto de rainha
Mesmo quando estou sozinha
Porque quero apenas ser.

Se você se espelha em mim,
Eu me espelho em você.


Frederico Salvo

10.10.10

O sol da nossa infância



Desterrado está o peito a própria sorte
Frente às turbulências todas desse mundo.
Se na superfície está o homem forte,
Fragílimo infante habita o profundo.

Quem, por gesto nobre e claro, não daria
Muito mais de si de forma abnegada?
Quem, o coração exposto não traria,
Fosse qual criança pura, acalentada?

Ferve na fogueira ardente da vaidade
A água que escalda a vã sobrevivência,
Sopa que se faz durante a caminhada.

Quanto mais avança o curso da idade,
Mais o ocaso encobre o sol da nossa infância...
Menos florescida; mais subjugada.

Frederico Salvo

7.10.10

Quem é quem?


Quem é quem nesse contexto?
Ao certo, flor ou inseto?
Duas vidas. Um pretexto.


Frederico Salvo

5.10.10

Momento


Deixo a mão pender sobre o silêncio
E os olhos baixarem a âncora no teu mar,
Pois nada mais me resta além desse sonho.
Esse peso sobre mim,
Folha branca a espera de um poema
Sobre a tua escrivaninha.
Calo-me e ouço os sons da tua boca
E a mímica do teu corpo
Traduzido por esses gestos
Que me abarcam a alma inteiramente.
Não me pergunto sobre o amanhã,
Nem sobre as horas seguintes a essa agora.
Não procuro saber o que serei
E nem o que serás no próximo segundo.
Cansei de prever o futuro. Apenas vivo.
E nesse momento te digo convictamente
E num sussurro em teu ouvido:
És como a bruma que passeia
Pela floresta virgem.
És como a chuva que cai ligeira
Depois de prolongado estio.


Frederico Salvo

2.10.10

Línguas


“Uma pessoa ocupada em servir nunca dispõe de tempo para comentar injúria ou ingratidão”.


Enquanto línguas cortantes, ferinas,
Só dão notícias das vidas alheias.
Enquanto arestas, farpas pequeninas
Se enroscam em ardilosas teias,
Outras entoam constantes, divinas,
Em outros pontos, em outras aldeias
A poesia de sensatas rimas,
A melodia de maviosas colcheias.
E nessa arte, desprendidas servem,
Enquanto as lavas desse mundo fervem
Num vulcanismo de intensa fúria.
São como botes contra a correnteza
Desafiando a humana natureza,
Num oceano de ingratidão e injúria.


Frederico Salvo