25.11.10

Rosa-dos-ventos (poema musicado)



Olá, amigos!!

Para finalizar o mês de novembro deixo aqui um soneto do poeta e amigo Júlio Saraiva, que tive a felicidade de musicar.
Espero que gostem.
Abraço!




imagino teu vulto em valsa
: ave branca a ciscar o sono
na transparência do quimono
a fresca nudez se realça

murcham sapatos no abandono
para os longes foges descalça
deixando-me a chave falsa
parado à porta deste outono

mas o outono a mim não importa
: recuso à natureza morta
que se apresenta em tons cinzentos

e mudo os tons - uso outras tintas
além daquelas com que pintas
os rumos da rosa-dos-ventos.




(Soneto de Júlio Saraiva)

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23.11.10

Impasse




A amarga continência da volúpia
Prudentemente poda o sentimento
Que solto quer voar conforme o vento,
E louco, convencer-me do contrário.

Em ti, imaginar não poderia,
Que houvesse, para a vida, mais sentido
E nem, tampouco, tanto colorido
Nas horas em perfeita companhia.

Um passo para trás, outro ao começo
E a dúvida cruel por qual padeço,
Um ósculo imprime em minha face.

Mas eu, me esmolambando de desejo,
Esqueço o gosto amargo desse beijo
E dou de ombro às dores desse impasse.


Frederico Salvo

19.11.10

Pela fresta da janela


Houve mais que um sussurro ontem. Houve
Mais que um perdido cão latindo ao longe.
Houve cruel razão qu'eu nunca soube,
Rasgando meu silêncio cru de monge.

Coube no peito meu o tudo. Coube,
Ambiguamente assim, o som do nada.
Ninguém p'ra perguntar baixinho: Ouve
A canção que se fez na madrugada?

Amanheci mais tarde nu e trouxe
Na boca um gosto amargo. A beberagem
Tornou todo o meu ser embriagado.

Um feixe-luz de sol aproximou-se,
Da fresta da janela fez passagem.

Liberto está meu peito estagnado.



Frederico Salvo

11.11.10

A espera de um poema




Deixo a mão pender sobre o silêncio
E os olhos baixarem a âncora no teu mar,
Pois nada mais me resta que esse sonho.
Esse peso sobre mim,
Folha branca a espera de um poema
Sobre a tua escrivaninha.
Calo-me e ouço os sons da tua boca
E a mímica do teu corpo
Traduzido por esses gestos
Que me abarcam a alma inteiramente.
Não me pergunto sobre o amanhã,
Nem sobre as horas seguintes a essa agora.
Não procuro saber o que serei
E nem o que serás no próximo segundo.
Cansei de prever o futuro. Apenas vivo.
E nesse momento te digo convictamente
E num sussurro em teu ouvido:
És como a bruma que passeia
Pela floresta virgem.
És como a chuva que cai ligeira
Depois de prolongado estio.


Frederico Salvo

6.11.10

Pote quebrado



Meu coração, esse pote quebrado,
Ainda guarda um palmo d’água fresca
Que afasta a sede, nutre e me refresca
Pelo deserto onde tenho andado.

É essa água que ainda me resta
Que umedece o peito ressecado,
Que mesmo pouca, supre e tem me dado
Alguma luz que a esperança empresta.

Meu coração, esse pote quebrado,
Guarda em seu bojo, precioso fluido
Que me dá vida quando a mim perpassa.

Néctar divino, líquido sagrado,
Que eu não a tenha à míngua por descuido.
Nunca me falte, mesmo sendo escassa.


Frederico Salvo

2.11.10

O chão por onde piso


Escuta. Quero que ouças em silêncio.
Esquece, pois temos tanto mais que isso.
Um passo num terreno movediço,
Está sujeito a erro. Assim penso.

Espera. O tempo, sabes, é senhor de tudo
E a vida cabe inteira num suspiro.
Portanto, se errando eu te firo,
Te dou o meu carinho como escudo.

Estive tão perdido sem teu braço,
E hoje se esses versos aqui traço
É tão somente por estar contrito.

Estanco a voz, recolho meu sorriso,
Pois a saudade é chão por onde piso.

Da dor de te perder, engulo o grito.


Frederico Salvo